OPINIÃO: Um jogo atípico, fora do padrão, por Luís Lima

Texto recebido de Luís Lima em 21/02/2019

Um jogo atípico, fora do padrão

BBB-19 parece que foi formatado para reproduzir a sociedade partida entre militantes e não-militantes, entre amarelos e vermelhos, entre politizados e alienados. Um espelho social de nosso país desde o último pleito. Na verdade, é a expressão da sociedade de classes com seus interesses divergentes e diferentes, com seus valores morais arcaicos, modernos e pós-modernos. É o conflito de um tempo histórico em movimento, em ressignificação de seus valores éticos, políticos, filosóficos, enfim, culturais.

Todo processo de mudança histórica traz o atrito, a discórdia ou a discordância, porque interesses, crenças e valores (morais, políticos e culturais) estão sendo questionados, postos em xeque. Logo, abala as certezas absolutas, o pensamento ossificado e a linguagem amalgamada. Fazer o furo no que está solidificado dói aos que estão petrificados nesses modelos de pensamento, diria, muitas vezes, da Idade Média. Pôr em xeque esta acomodação cultural, incomoda. Acho isso ótimo. É a evolução social.

Pois bem, o BBB-19 trouxe o incomodo aos acomodados, que já estavam acostumados a um modelo de BBB maniqueísta, entre o bem e o mal, os bonzinhos e os mauzinhos, entre os heróis e os vilões. Este é jogo padrão estruturado pelo Programa. Quando uma nova safra de BBBs quebra este formato, ao se expressarem tacitamente que não querem ser vilões ou heróis, mas apenas jogadores que querem o 1,5 milhão, e não querem ser nominados como paneleiros, eles causam estranheza, decepção e raiva no público sedentos por BBB-novela ou BBB-ratinho, “porrada”.

E me pergunto? Os BBBs estão certos ou errados? Querem ser personagens que o programa cria nas edições ou jogadores ávidos para vencer o jogo? Ora, quem quer ganhar o milhão e meio, não pode desagradar o público, ou seja, não pode ser o malvado da história, para que o oponente seja a vítima que agrade o público e vença. Parte do público muitas vezes é sádico e masoquista, é Fla-Flu. A isonomia da competição está aí, a meu ver. Todos se vendem bonzinhos, honestos, éticos ou alguns vendem sua personalidade forte, arriscando agradar ou não a maioria, como fez Hana. Como nada é unanimidade, há quem goste e há quem não goste.

Então, a meu ver, os jogadores estão certos em não fazer o jogo padrão do programa para dar audiência simplesmente, colocando-se na forca como vilão, traidor, fuxiqueiro, leva e traz etc., correndo o risco de perder o prêmio. A não ser que não lhes interessa vencer, mas apenas se apresentar para a mídia televisiva e dizer que existem para trabalhar com ela. Cada um faz o seu jogo como quer e pode. Cabe a nós gostar ou não.

Portanto, essa nova safra de jogadores derrubou os padrões pré-estabelecidos do programa, propondo-se a ser jogador do jeito que eles sabem ser, sem mimetismo ou cópia de outros programas e personagens.

Dito isso, vou me ater agora aos jogadores, melhor, a dualidade de brancos e pretos, a ambivalência de loiros e negros, o confronto entre a classe média e a classe baixa, porque esta é a formatação deste BBB, o conflito de classes. Militantes e Alienantes, para mim, traduzem a caricatura do BBB-19. Foram escolhidos pessoas com histórias de militância político-social e pessoas alheias à participação político-social, melhor dizendo, pessoas do mundo doméstico-social. Talvez a ideia dessas escolhas fosse reproduzir a guerra ideológica entre os amarelos e vermelhos que ocorreu aqui fora nas eleições passadas, achando que, com isso, barracos, discussões políticas acirradas dariam um enredo de sucesso ao programa. Errou feio. Pois isso está se dando, por incrível que pareça, fora da casa.

É nas redes sociais que este conflito e confronto ideológico está se dando. Alguns incomodados com os militantes que simbolizam o esquerdismo (o que é um engano, pois nem todo militante é de esquerda), outros incomodados com o grau de preconceito revelado nas falas dos não-militantes, (que nem sempre são de direita, apenas com valores conservadores), como se fosse natural e normal, por exemplo, uma loira dizer que tem cabelos “ruim” ou que tem avô negro, sendo toda família branca. Parece mais um deboche do que uma inocente ignorância.

Por isso que é difícil dissociar política da vida social, porque a vida social está permeada de ideologias de todos os tipos, seja religiosa, seja política etc. Entendendo ideologia aqui como um conjunto de ideias que permeia o nosso pensamento com uma visão de mundo, de sociedade.

Neste sentido, a ideia de planta, de protagonista, de vilão, de coadjuvante, de figurante neste programa fica sem sentido. Porque até agora não vimos o protagonista, o vilão, o coadjuvante e a planta (que é algo bem relativo, porque plantas já venceram o BBB).

Eu pessoalmente não vejo o grupo Gaiola ser arrogante, agressivo e patrulheiro, porque trava um debate linguístico sobre determinados termos pejorativos usados para “denegrir” oprimidos como favelado, cabelo ruim, índio bicho, etc. O debate e a discussão são fundamentais para elucidar o caráter ofensivo que traz certas palavras embutidas de preconceitos sociais. A evolução humana se dá nesse confronto verbal, racional e simbólico entre diferentes, porque é a partir do choque entre dois polos antagônicos que nascerá a NOVA SOCIEDADE, a VERDADE HISTÓRICA como fundamento da FELICIDADE.

A felicidade nunca será individual, se ela não for coletiva, se ela não for estendida a todos. Muitos de nós têm momentos de felicidade que se esvaem com o tempo (muitos nem têm), apenas se eternizando nas lembranças. Aristóteles dizia que a Felicidade é a Justiça Social, no seu belo livro “Ética à Nicômaco”.  E quem luta por justiça social, busca a felicidade. Acho que a proposta do programa é que grupos sociais diferentes possam se solidarizar, se comunicar, encontrar pontos em comum, trocando experiências, falas de vida, porque cada um ali fala e conversa o que vive aqui fora. Se vc for pôr um Nerd no programa, com certeza ele falará daquilo que ele está envolvido. Natural!

Não sou pessimista em dizer que o programa está um fracasso, por ter um formato subjetivo-objetivo diferente de outros BBBs, com pessoas de classes sociais misturadas, com suas vidas antagônicas e diferenciadas. Acho que poderíamos ver o programa como algo diferente dos outros, sem barracos, sem gritos, sem agressividade a flor da pele; porque também dizer que todos dormem e não fazem nada é uma ladainha que ouço e vejo quase todos os anos dos que pagam PPV. É preciso entender que as pessoas não são máquinas ou robôs para estarem 24 horas conversando. O corpo cansa, a mente estressa e o descanso e o bom sono são fundamentais para repor energia. Mais humanidade e menos robotização do ser humano. Estejamos abertos aos contrários, às críticas. Contrariar, mobiliza o ser humano. Um abraço a todos.   

Luís Lima - Luiz_113@hotmail.com

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