O BBB18 entra em sua reta final revelando que jogo de gente grande, aquele que mexe com as emoções, faz vibrar o pessoal do sofá, causa inquietação e expectativa pela imprevisibilidade do que virá, aquece as redes sociais, só aconteceu por conta de seus antagonistas. 

À medida que eles foram sendo eliminados, Viegas com seu papo cabeça foi o último a sair, tudo o que povoou os nossos sentidos e emoções até então, se transformou num cansativo jogo de ciranda cirandinha.

Quando a edição tinha tudo pra explodir com o público sendo cúmplice dos agentes do caos, com seu jogo aberto para o pessoal do sofá, optou-se por uma edição enfadonha, povoada por gente pueril transformada em “fadinha”, fazendo birra e ficando de mau quando alguém cogita sua indicação ao paredão e, a um bedel dizendo como a turminha deve se comportar e votar, no tedioso recreio da quarta série que o BBB se transformou.

Onde está a “fadinha” ali, não sei. Porque as fadas ao menos têm sua função e elas são parte importante da narrativa dos contos infantis, que vai muito além de reclamar, fazer beicinho porque foi votada ou bater o pezinho e ficar revoltadinha porque foi contrariada. Aliás, se as fadas assim se comportassem nas histórias, as crianças começariam a torcer pelas bruxas.

Sob a perspectiva da dinâmica do BBB hoje, chamar Gleici e Ana Clara de fada, chega a ser ofensivo às fadas criadas por Charles Perrault, Irmãos Grimm e que fazem parte do nosso imaginário.

No decorrer destes pouco mais de dois meses, Gleici quase nada fez, a não ser aceitar ser resgatada por Ana Clara do joguinho de ser a rejeitada da edição, que a ruivinha, esperta que é logo percebeu e, com astúcia, tratou de desfazer chamando-a pra brincar. Afinal quem é visto como rejeitado e coitadinho, ganha simpatia aqui fora e cresce. No mais, a acriana com voz e jeito forçado de menininha, só ganhou algum destaque em razão daqueles que movimentaram o jogo com suas combinações de voto e não esconderam isso do público. Eles que só a mandaram para o paredão após três votações. Porque a moça era/é tão inexpressiva, que no início sequer era lembrada.

Quando começou a ser votada, Gleici voltou ao seu joguinho inicial: a menininha rejeitada e perseguida no meio da floresta habitada por bruxas e lobos maus. Claro que quando estes foram eliminados, acabou o enredo pra ela. Só lhe restou como discurso, discorrer sobre estar no próximo paredão porque “aquela gente que vota é malvada”, até mesmo quando não está ameaçada, e esquecendo que ela também vota.

Nesse território mais do que batido, Gleici nada acrescentou ao jogo. Em termos de narrativa, Jéssica mostrou muito mais. Foi o ser mutante daquela floresta. Trouxe a figura diáfana da Ana Lúcia pra dentro da casa. Quando perdeu o aliado, sem assumir o papel de vítima ou ficar de mimimi, formou novas alianças, sendo fiel a elas. Reposicionou-se e partiu pra novas parcerias, quando foi necessário. Revelou concentração, força física e mental admiráveis, em especial, nas provas de resistência. No quesito memes, foi a princesa da edição com suas tiradas pra lá de surreais. E ao final, formou uma dupla divertida, leve e interessante com Kaysar, o menino esquisito da turma, que as “fadas” apenas toleram.

Caso Gleici tivesse ficado trancada no quarto secreto até aqui, o jogo em nada teria mudado. Como não mudou nos dias em que ali permaneceu. Porque ela não tem uma narrativa. Não tem a vontade e a gana de uma Jéssica. Não contribui sequer para a limpeza e arrumação da casa. É incapaz de ao ver louça suja na pia, vestir o avental e lavá-la. Ela apenas continua na casa em razão da torcida que se formou e/ou foi recrutada no entorno dela, sob a ilusão dela ser uma “fada”, quando ela não o é. Assim como a Ana Clara também não.

Tanto é assim que, após o quarto secreto e eliminação do Diego, fomos apresentados a uma Ana Clara e a um Ayrton, que não conhecíamos. Fenômeno semelhante ao que se vê em Wicked, onde Gregory Maguire apresenta a história não contada das bruxas de Oz. 

O que não havia sido contado por pai e filha até aqui, surpreende e decepciona.

O choque é o mesmo que se tem ao saber que, a “bruxa boa do norte”, Glinda, no seu íntimo, é uma patricinha fútil, que não se importa com ninguém além de si mesma e é obcecada pelo dinheiro e o status. Da mesma forma que, a Ana Clara descolada, divertida, acolhedora, madura, acabou revelando ser uma mocinha intolerante, hostil, mimada, cega em suas verdades, obcecada em não ir ao paredão e ganhar o prêmio.

O pai de Clara não fica atrás. O Ayrton que no início reclamava e chorava por estar sendo rejeitado em razão da idade, tal qual o Mágico de Oz de Maguire, acabou por se revelar o grande vilão deste BBB. 

Lá em Oz, embora as motivações de Glinda sejam questionáveis, elas não se comparam às do mágico ilusionista. O Mágico que na verdade não passa de um déspota, que não mediu esforços para destronar a rainha e tomar à força o poder, ameaçando exterminar quem se colocasse em seu caminho.

Ayrton tem agido na terra BBBzíaca, assim como o Mágico na terra de Oz.. 

Na sua ânsia para chegar à final e ao prêmio, sem piedade, tem acuado os demais quando votado; diminuído e depreciado quem votou nele durante o programa ao vivo; gargalhado e tripudiado de quem está no paredão, como cansou de fazer com o Viegas; declarado guerra a quem ousou/ousa votar nele e na filha; ironizado a conduta e história de vida dos adversários; ordenado no mural os avatares, para induzir o público a votar como ele quer. Tal e qual a tirania que Maguire descreve em Oz.

Com um detalhe: Ayrton faz isso, como se tudo fosse uma grande brincadeira inocente e ele um “paizão” conselheiro de todos, dotado de um tremendo espírito esportivo. A alma mais honesta e compreensiva que já passou por ali. Quando na verdade as expressões em seu rosto mostram que o seu pensar e intenções são outras, no sistema totalitário que implantou no reality. Julga-se tão esperto e acima de todos, que até a narrativa ele tenta tirar do apresentador, Thiago Leifert.

Paula que se cuide. Poderá ser o próximo alvo de pai e filha por haver votado neles com uma justificativa pra lá de lúcida e verdadeira. Sim, Ana Clara e Ayrton levam vantagem sobre os demais, por terem descanso semanal das provas, inclusive a do líder; por se apoiarem entre si, Ayrton muitas vezes segurou a impulsividade e fúria da filha, a filha muitas vezes alertou o pai sobre seu comportamento arredio e inflexível; por serem dois, conseguem cercar a todos da casa, inclusive para influenciar votos, que dizem não combinar; por atuarem em jogral, enquanto um chora dizendo-se “decepcionado” com alguém, o outro o afaga e pega no colo durante o programa ao vivo, para impactar quem assiste.

E Paula ainda não sabe que, Eva e Jorginho, continuam fazendo parte do BBB, ao acolher ex-BBBs em sua casa, como Mahmoud, permitindo que apareça em primeiro plano nos vídeos da família às terças-feiras, com a intenção deliberada de atrair a torcida do ex- participante para os Lima.

Em determinados momentos, Paula demonstra ter uma lucidez invejável, a coragem dos rebeldes e um perfil anárquico, que surge quando menos se espera. Às vezes dá vontade de aplaudi-la em pé, em especial quando revela as mazelas da hipocrisia que tem ali. Pena que tenha se policiado tanto. Talvez por saber que o público prefira comprar arquétipos a gente de verdade, quarta série a gente grande. Nesse caso, fazer pipoca pra divertir a turma do sofá, sem dúvida, é a escolha mais inteligente e acertada.

Por ser assim, chega-se à conclusão de que o jogo do Kaysar é perfeito. Entrou com um propósito: reencontrar os pais. Não deixa de ser um apelo forte. Fez o jogo solo, divertindo sendo o “bobo da corte” e parceiraço de todos, sem deixar de estar atento ao jogo, pois de bobo não tem nada. Quando a dinâmica o chamou para fazer alianças, ele as fez. E escolheu o lado certo. Foi acolhido e aceito pelo lado “du mal”, sem ninguém questionar estar ele sendo um personagem ou não ou rejeitá-lo por sua cor verde. Claro, além de fortalecer o grupo por ser um a mais. No entanto, se tivesse optado pelo outro lado, o “du bem”, ali ele teria sido apenas um voto e, mais dia menos dia, seria criticado pelas costas por sua cor verde, não podendo em razão disso ter a mesma ambição e desejo de chegar à final que os outros. 

E aiaiaiai... se ele com a sua cor verde, sem ser o incrível Hulk, ousasse após trinta horas, ganhar a prova de resistência tornando-se líder, um carro e uma princesa com coroa, delicada, engraçada e estabanada, que lhe devolvesse o brilho que estava se apagando... estaria fadado a ir al paredón, na primeira oportunidade...

E, o Breno... esqueceu dele?!? 

Não me esqueci, não. Se há uma palavra que o defina, é cautela. Ele é aquele menino que no jogo de futebol, sempre irá preferir ficar no gol. E, nesse sentido, tal qual o Kaysar, também acertou. Não se expôs, não se desgastou, não se envolveu em conflitos, não amealhou rejeição, apenas curtiu e se divertiu. Tanto é que conseguiu chegar entre os cinco finalistas. E isso não é pouco, não!!!

Além do mais, a participação do Breno trouxe mais alguém pra esta edição. Aliás, este é também o BBB dos participantes que não entraram na casa. Esse alguém brilhou até mais que ele: Maria Olívia, sua mãe. Figuraçaaaaaa.... Faz a gente ficar esperando o vídeo das famílias pra vê-la com coroa na cabeça, gritando, chorando, torcendo, aconselhando, pegando o chinelo na mão... Paula... você nem imagina o que, quem, te espera aqui fora!!!! Pode baixar a cabeça, sacudir, pular, que a sua coroa - Maria Olívia - não cairá. Você foi/é o show das nossas terças, sem precisar reunir ex-participantes ou um comitê de partido político em sua casa, para reinar, encantar e explodir no queridômetro de todos nós.

Pra fechar, quero acrescentar:

A reflexão que Gregory Maguire faz em Wicked é a de que sempre há duas vertentes. Dois lados. Quando as pessoas se portam como antagonistas, isso não quer dizer que elas sejam piores que os demais; assim como, quando as pessoas são vistas como “fadas”, isso não quer dizer que elas sejam mais perfeitinhas, puras, virtuosas ou melhores que os outros.

Os personagens de Maguire, assim como nós, são lapidados a partir da dicotomia entre o bem e o mal, que ganha contornos a partir da história de cada um. Aviso portanto aos iludidos: não há lado “du bem” ou “du mal” puro.

A hipocrisia, falsidade e a chatice estão em tentar embriagar e enganar com um discursinho infantil e enfadonho de que a bruxa e o lobo mau são os outros, quando no fundo, em algum momento, todos na infância torcemos para que a bruxa se desse bem e para que o caçador da Chapeuzinho, não matasse o lobo mau.

Como dizia Jung, na essência, somos luz e sombra.


Shadow / Mariasun Montañés
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