Texto recebido de Luís Lima em 08/04/2019

Gabriela, 33 anos, negra, ativista, designer gráfica e percussionista, entrou no BBB com objetivo de ganhar o prêmio, claro, mas sobretudo, de se mostrar como negra que luta pela emancipação da mulher, do negro e do homossexual. A luta é também simbólica, dialógica e relacional, sobretudo num espaço televisivo como BBB, que pode abordar temas tão relevantes e sensíveis à sociedade. E por que não aproveitar esse espaço para, pelo menos, uma vez, tocar nesta realidade tão viva e terrível aqui fora?

Não concordo com certas assertivas que dizem que eles politizaram o BBB, que queriam militar no BBB. Ao contrário, Gabi, junto com Rodrigo, queria esclarecer e informar sobre determinados usos de termos ou expressões pejorativas que negativizam a imagem do negro na sociedade classista, ou seja, queria dissociar certos termos pejorativos da palavra negra, já que esta está associada a uma etnia social, como por exemplo, humor negro, ovelha negra da família etc., com conotações que colocam o negro como o mal de tudo. Acho que essa é a verdadeira discussão. O negro sabe como é tratado no Brasil racista, classista e conservador.

Mas Gabi foi, antes de tudo, uma mulher carinhosa, do sorriso, da brincadeira, do diálogo racional, calmo e não da briga, da discórdia. Se eu pudesse definir Gabi numa palavra, a definiria como Respeito. Gabi só reivindicava o respeito à luta dos negros, ao negro, ao homossexual, às religiões afros, que são mais antigas do que o próprio Cristianismo, combatendo a intolerância sexual, religiosa, política, de todos os tipos. Não é a Umbanda ou o Candomblé que usa sangue de animal para fazer o batismo, mas a Quimbanda que vem do nome do sacerdote ou feiticeiro Bantu, que através da magia, controlava todos os atos sociais e religiosos de seu povo na África. Na Cultura afro-brasileira, o termo Quimbanda designa um tipo de magia “negra”, que se utiliza das forças do mal por oposição à magia branca da Umbanda voltada para o bem. Ler um pouco de história das religiões do mundo pode combater a nossa ignorância sobre as religiões afros.

No começo do jogo, Gabi não era alvo de ninguém e passeava pelo jogo tranquila, sobretudo, quando o grupo do Diego foi saindo de um por um, com exceção de Carol peixinho. O que unia Gabi ao Gaiola? Ora, as histórias de vida parecidas de opressão social, de repressão sexual, enfim, de serem componentes do mesmo esteio. Gabi viu Rodrigo como um Guru espiritual, um amigo inteligentíssimo para sempre, como declarou depois que saiu do BBB. Gabi tinha Rodrigo e Rízia como finalistas junto com ela. Não era muito ligada a Dan ou Elana. Com esta última teve um pequeno desentendimento, mas porque Gabi não conseguiu entender que certos termos regionais são usuais e naturalizados como normais. Esta guerra terminológica foi o que deu um certo enredo ao BBB. A saber: como corrigir vícios culturais? Como fazer uma cultura de mentalidade e comportamento escravocrata ser abolida para se construir a sociedade da fraternidade?

O BBB poderia ter desenvolvido este enredo tão presente e efetivado no nosso dia a dia. Na forma de entretenimento sim, com discussões, até confrontos de valores, sem aquele BBB alienado, de discurso vazio, árido, cuja pauta é barraco e confusão de emoções descontroladas. Gabi, talvez, tenha sido mais incisiva neste tema do que Rodrigo, já que este lhe deu um alerta para não radicalizar com o risco de se tornar uma militante chata, agressiva etc. Não lembro bem das palavras, mas o teor da conversa foi esse.

Gabi transitava nos dois lados, como uma mulher que não discriminava ninguém, que respeitava o adversário. Mas na hora H, Gabi sabia de que lado estava e de que lado ela poderia contar, o lado do Gaiola. O defeito de Gabi é fumar. Acho que sua libertação é não fumar mais, quer dizer, se livrar das correntes do cigarro. Espero que ela desenvolva essa consciência para que se torne prática. Mas lembrando de uma canção agora, da abertura da novela Gabriela, há uma estrofe que expressa bem o existir Gabi, nessa interpretação:

Quando eu vim para este mundo, eu não atinava em nada, hoje eu sou Gabriela, Gabriela, ê meus camaradas. Eu nasci assim, eu cresci assim e sou mesma assim, vou ser sempre assim: Gabriela, sempre Gabriela! Quem me batizou, quem me nomeou, pouco me importou, é assim que sou, Gabriela, sempre Gabriela. Eu sou sempre igual, não desejo mal, amo o natural, etc. e tal. Gabriela, sempre Gabriela.

Acho que a letra dessa música define bem a ontologia de Gabi, seu Ser, sua essência humana. Uma criança negra quando vem ao mundo não sabe o que lhe espera e se for homossexual, pior ainda. Mas enfrentar todas as hostilidades dos preconceitos e maus costumes sociais com amor, respeito e naturalidade sempre buscando o bem é uma excelente arma virtuosa para neutralizar o mal. Gabi, vá com Deus e busque seu amor, porque só o amor é libertador. O ódio é escravizador e hediondo. Feliz Vida!